Vários escritores têm alegado que precisamos apoiar outras abordagens
que não a abolicionista porque esta foi marginalizada politicamente e
fracassou.
Por exemplo, em seu livro Zoopolis: A
Political Theory of Animal Rights, os filósofos Sue Donaldson e Will
Kymlicka observam:
Uma tarefa central do movimento é
descobrir por que a ART [teoria dos direitos animais—TDA] continua sendo tão
marginal politicamente. Por que o público em geral está cada vez mais aberto às
reformas bem-estaristas e ecológicas, tais como a Proposition 2 ou a legislação
sobre as espécies ameaçadas, enquanto permanece implacavelmente resistente aos
direitos animais? Tendo reconhecido que os animais são seres vivos cujo
sofrimento importa moralmente, por que é tão difícil dar o próximo passo e
reconhecer que os animais têm direitos morais a não ser usados como meios para
os fins dos humanos?
Donaldson e Kymlicka alegam ser grandes simpatizantes da perspectiva
abolicionista. Mas perguntam: por que essa posição permaneceu tão marginal?
Terei muito mais a dizer sobre esse livro em uma resposta que estou
escrevendo aos professores Kymlicka e Donaldson, assim como a outros que
escreveram recentemente sobre a teoria abolicionista. Mas acho estranho que
eles pensem que haja algum mistério aqui.
O “movimento de defesa animal” está dominado por grupos grandes que
promovem as reformas do bem-estar e, na realidade, não medem esforços para
marginalizar a perspectiva abolicionista.
Assim, não é provável que o público, que está preocupado com a ética animal, vá “dar o próximo passo”,
quando Peter Singer,
o chamado “pai do movimento pelos direitos animais”, afirma:
se alguém “realmente só comesse
animais que tiveram vidas boas, essa poderia ser uma posição ética defensável.
Não é a minha posição, mas eu não criticaria alguém que fosse assim tão
consciencioso”.
Segundo Singer, se proporcionarmos uma vida razoavelmente agradável e
uma morte relativamente agradável, já estaremos cumprindo com nossas obrigações
morais para com os animais. Por exemplo, Singer diz:
Para evitar infligir sofrimento
aos animais—sem falar no impacto ambiental causado pela produção animal
intensiva—precisamos cortar drasticamente os produtos animais que consumimos.
Mas isso significa um mundo vegano? É uma solução, mas não necessariamente a
única. Se estivermos preocupados com o fato de infligirmos sofrimento, e não
com o fato de matarmos, então também posso imaginar um mundo em que as pessoas
comam principalmente alimentos vegetais, mas, de vez em quando, se deem o
prazer e o luxo de comer ovos de aves criadas soltas, ou, possivelmente, até carne
de animais que tenham vidas boas em condições naturais para as suas espécies, e
que depois sejam mortos de modo humanitário na fazenda. (The Vegan,
outono de 2006).
Então Singer diz ao público que o bem-estar animal é uma resposta
moralmente defensável às questões fundamentais da ética animal. Por que alguém
deveria ir mais longe? Por que alguém iria mais longe?
Por que as pessoas deveriam se tornar veganas, quando o executivo-chefe
da Humane Society of the United States Wayne Pacelle,
que é, ele próprio, um vegano, afirma claramente que a carne “feliz” é uma
coisa moralmente boa? Pacelle declara:
Eu não acho que todo mundo precise
adotar uma dieta vegetariana para fazer uma diferença. Acho que as pequenas
escolhas que fazemos—comprar produtos de origem animal de um fazendeiro que
esteja criando animais de um modo apropriado e humanitário, ou reduzir um
pouquinho o nosso consumo—tudo isso importa. Você não precisa ir até o fim,
para ter um impacto. Uma coisa que eu não quero é que as pessoas se sintam
paralisadas, que de alguma forma você tenha de se adaptar a um regime ortodoxo
para fazer parte disto. Absolutamente não. As pequenas decisões que todos nós
tomamos podem ter uma enorme consequência.
Você pode ter um impacto comendo carnes e outros produtos animais “de um
fazendeiro que esteja criando animais de um modo apropriado e humanitário”.
Então a HSUS está não apenas sugerindo que os produtos feitos “de um
modo apropriado e humanitário” estão realmente disponíveis, mas também que
consumi-los é coerente com tratar os animais como membros da comunidade moral e
se importar moralmente com eles.
A HSUS promove
ativamente o consumo de carnes e outros produtos animais.
Donaldson e Kymlicka observam que mesmo a People for the Ethical Treatment
of Animals (PETA), percebida como defensora de uma mensagem radical, promove as
reformas do bem-estar.
De novo, se as pessoas que são percebidas pelo público como porta-vozes
dos animais afirmam que a reforma do bem-estar é tudo que se requer no plano
moral, por que o público pensaria outra coisa?
Conforme declarei no livro que escrevi juntamente com o professor Robert
Garner, The Animal
Rights Debate: Abolition or Regulation?”:
O movimento de defesa animal
moderno nunca promoveu uma mensagem
vegana/abolicionista clara e inequívoca. Ao contrário. Quase todos os grupos
grandes nos Estados Unidos, no Reino Unido e nos demais lugares promovem uma
abordagem bem-estarista, e, na medida em que chegam a falar sobre a abordagem
vegana/abolicionista, eles a apresentam como uma espécie de objetivo distante e
utópico. Com frequência, rotulam pejorativamente o veganismo de “absolutista”,
“fundamentalista” ou “purista” e, seguindo Singer, promovem a ideia de que ser
um “onívoro consciencioso ” é ter uma posição moralmente defensável.
Por favor, compreendam que não
estou dizendo que se todos os grupos de defesa animal mudassem de foco e
fizessem uma campanha vegana/abolicionista clara e inequívoca, aboliríamos a
exploração animal de um dia para o outro, ou em algum momento muito próximo.
Mas, pelo menos, daríamos início à necessária mudança de paradigma focando a
discussão nas questões certas. O modelo bem-estarista fracassou e continuará
fracassando porque foca na discussão do conjunto errado de questões. E eu
discordo vigorosamente de que o direito a não sofrer, sem uma discussão sobre a
moralidade do uso em si, vá levar a algo que não seja mais regulações
bem-estaristas do mesmo tipo de sempre.
Então, em resposta à pergunta dos professores Donaldson e Kymlicka, o
problema não é que a perspectiva abolicionista seja marginal; o problema é que
a posição abolicionista tem sido ativamente marginalizada por um movimento de
defesa animal que consiste em enormes associações de caridade pró animais, as
quais dominam o mercado de ideias e dizem ao público que as reformas do
bem-estar são tudo de que precisamos.
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Se você não for vegano(a), por favor torne-se vegano(a). Veganismo é não
violência. Sobretudo, é não cometer violência contra os outros seres
sencientes. Mas também é não cometer violência contra a Terra e contra si
mesmo.
Gary L. Francione
Professor, Rutgers University
© 2012 Gary L. Francione
Tradução: Regina Rheda